O Funcionários é um bairro parado, com poucas pessoas nas ruas e quase silencioso (se não fossem os carros) em um sábado pela manhã. Isso ficou claro diante do resultado de expormos alguns objetos no meio das ruas.
A valorização de prédios e do trânsito faz uma relação de causa/conseqüência com a situação, se transformando em um ciclo vicioso: mais prédios e carros, menos pessoas nas ruas; menos pessoas nas ruas, mais valorização de prédios e carros. Logo, segundo Jane Jacobs, as ruas deixam de ser seguras por não ter quem as vigie e esse papel é passado à guardas privatizados que não tem relação direta com a rua e são, portanto, naturalmente menos eficientes¹. A falta de segurança afasta as pessoas da rua e umas das outras.
Nós temos condições de discutir e tentar mudar arquitetonicamente essa situação (que está literalmente na nossa frente), foi isso que entendi que os professores buscavam com o trabalho de ocupar a vaga de um carro de outra forma. Como escreveu Hertzberger, toda arquitetura afeta a sociedade², e dessa vez não foi diferente
Meu grupo propôs um playground para trazer a criança de volta à rua, lugar onde muito esteve e de onde tem se distanciado cada vez mais devido ao processo acima (sem consciência dele na maioria das vezes). Utilizamos pneus porque, além de fazer a relação com a vaga, nós sabíamos de seu uso em parquinhos e, para ampliar a questão, os pintamos como faixas de interditado (apesar de algumas pessoas preferirem relacionar à copa).
O projeto era composto por carrinhos, balanço em árvore, pula-pula e pufes estofados com brincadeiras. Havia sugestão de atividades, mas as crianças (ou mesmo adultos) podiam se apropriar de maneiras diferentes, inclusive dos pneus deitados que delimitavam com a pista.
A interação com o playground foi limitada em quantidade, mas em qualidade foi muito interessante. Atitudes típicas das nossas discussões puderam ser observadas, como pais apressando os filhos para ir embora (o exemplo dos adultos faz diferença¹, nesse caso, infelizmente), mães dizendo que não conhecem outras crianças para brincar com seus filhos e estes empolgados em atividades que não costumam ter, principalmente na rua.
Houveram aqueles que passaram de carro, perguntaram o que era, pediram por ações como essa no bairro e também aqueles apáticos a qualquer coisa que aquilo poderia significar. As pessoas costumam cometer o erro de acreditar que as coisas se organizam de acordo com as melhores intenções, mas devemos ser capazes de distinguir por nós mesmos o que está acontecendo ao nosso redor².
Referências diretas à:
¹Morte e Vida das Grandes Cidades – Jane Jacobs
²Lições de Arquitetura – Herman Hertzberger